RADIO ROCKPEDIA: 1 Ano de muito rock nas ondas sonoras caxienses

[ENTREVISTA] Por Marco Paim


Na última semana a webradio rocker caxiense Rockpedia fez um ano de existência divulgando novas bandas e vem mantendo vivo a chama do rock e dando abertura ao som que é feito por aqui. Entramos em contato com o idealizador e diretor executivo da rádio, nosso parceiro Luciano Cardoso, para conhecer mais sobre o trabalho de uma das melhores wbradios do estado. 

HEAVYNROLL - Um ano de Rockpedia. Como e porque surgiu a ideia de fazer uma rádio rock? 

LUCIANO - A Rockpedia nasce da vontade de se valorizar e compartilhar música daqui, ou seja, música nossa contemporânea e de qualidade em comparação com o que já é clássico, canônico. Acredito no processo de sensibilização do que é artístico nas pessoas, através da música. A Rockpedia quer oferecer programas com conteúdo educativo, social, cultural e artístico. Ela se apresenta como Rádio Rock da Internet, propondo um conceito mais abrangente do gênero rock. Aqui, blues é rock, jazz é rock, reggae é rock. Esses gêneros dividem raízes, dividem elementos, compartilham cultura, então com o rock podemos fazer uma passeata pela história toda da música. 

Além disso, a ideia de rádio aqui deixa de ser apenas uma onda e passa a ser também uma entidade viva e multicultural. É um conceito, também, e se propaga confortavelmente pelas tecnologias de hoje, dialoga e se entende bem com a internet, privilegiando as linguagens contemporâneas. Na Rockpedia, rádio abrange canção, teatro, cartoon, literatura. É um espaço de interpretação civil das artes e das ideias. Somos uma rádio web que compartilha ideia, música e informação. É, sobretudo, uma rádio feita de pessoas que acreditam no potencial de criatividade e no direito de expressão dessas pessoas. 

A Rockpedia surge também para tentar provar um ponto de vista, que há muito tempo eu debatia em conversas animadas com colegas de rádio, ainda no tempo que atuava em emissoras FM em Caxias do Sul. Eu faço minha aposta na pesquisa musical continuada que se expande a partir das peças que já se tornaram hits e grandes nomes. O conceito de bom artista vem das décadas passadas, anos 60, 70 e 80 (e até de muito antes) e segue existindo enquanto o mundo continuar girando. Há bons músicos e compositores hoje, em 2013, há muita gente compondo bem, tanta arte surgindo de todos os lados. Nesse contexto diversificado e rico, com a internet florescendo da maneira como está, eu acredito na ampliação dos nomes que devam brilhar nos playlists de muitas emissoras de rádios pelo Brasil afora. Há uma fatia temporal e um determinado panteão da música internacional e brasileira que nos serve de referência histórica, mas muitos destes artistas seguem produzindo obra nova nos dias de hoje. Eles estão ali na nossa frente mostrando algo novo, outra faceta das suas carreiras, às vezes recém-descoberta, das suas próprias produções artísticas. 

Temos exemplos do Rio Grande do Sul como Bebeto Alves, Claudio Levitan e Hique Gomez, de São Paulo como Edvaldo Santana, dos Estados Unidos como Bob Dylan, da Inglaterra como Mr. Robert Plant, e a lista é longa, vocês sabem, dos que têm trabalhos recentes tão ricos quanto os inesquecíveis clássicos que produziram. Então temos um fenômeno que merece ser estudado com carinho e atenção. Esses e outros artistas seguem fazendo a crônica da nossa contemporaneidade e nos ensinando a pensar e a sentir a arte e a sociedade, esta em que nos enroscamos todos num novelo de mudanças e num tempo em que estamos condenados a sermos melhores do que já fomos um dia, para usar os versos do Bebeto. Portanto, em termos gerais, o tal do novo carrega muito do velho.

Percebendo a indústria fonográfica tradicional, as concessões de emissoras e seus produtos como algo meio enferrujado, meu impulso foi buscar uma alternativa, como comunicador e criador de conteúdo, que não tivesse impedimentos para exercitar e fornecer pesquisa musical. Daí, isso foi amadurecendo e deu na Rockpedia. Muito disso se deve às mudanças tecnológicas, claro. Ainda assim, meu foco não é numa performance estritamente radialística que tenha só mudado de tecnologia, pois não sou o locutor web que faz o tipo com voz simpática que quer a qualquer custo, às vezes irresponsável, te vender um carro ou te convencer a gastar delirantemente a tua grana numa festa promovida pela rádio. Em outra perspectiva, busco um contato honesto com o público ouvinte e me pergunto: quem será esse cara que está ouvindo enquanto eu vou mapeando a música atual? Porque é isso que eu vou fazendo, vou procurando as bases nas quais essa música já se apoiou, sua evolução, suas variantes e vou disponibilizando isso pra esse ouvinte.

HEAVYNROLL - Quais foram e quais ainda são dificuldades de se ter uma web rádio no sul do país? 

LUCIANO - São várias as dificuldades da web rádio neste contexto. Algumas estão associadas ao sul do país, mas outras ao próprio momento da tecnologia envolvida no processo. Uma delas é uma questão histórica da comunicação no Brasil. É a outra é que o conjunto, ser rádio e ser web, ainda é pouco levado a sério como veículo, em geral.

A comunicação social brasileira, com raras exceções, tem muitas rádios convencionais que dão pouquíssimo suporte à comunidade local e reproduzem a velha fórmula de se restringirem aos hits fabricados e ditados pelas grandes emissoras de TV e rádio do Rio de Janeiro e São Paulo. Isso tem sido assim há muito tempo e, seja voluntária seja involuntariamente, já está funcionando como uma arma de segregação. Se essa mentalidade falasse ela diria algo assim: “venha tentar o sucesso no Rio e em São Paulo, pois os outros lugares são inexpressivos”. Com essa filosofia de trabalho, ao longo de décadas, as programações e as audiências das emissoras FM das nossas grandes cidades do sul, Caxias sendo um exemplo, deixaram de compartilhar um enorme contingente de artistas de excelente qualidade, gêneros de grande variedade e assuntos relevantes para as crescentes comunidades que passaram despercebidos. Considerando que estamos na região da Serra Gaúcha que ainda recebe imigrantes de quase todos os cantos do planeta, essa filosofia é que seria inexpressiva para o caldo de cultura que é gerado aqui. Em termos de conteúdo cultural em uma região tão diversificada, eu considero uma limitação falar-se apenas do clima, dos crimes e da economia para os ricos investidores, o que caracterizaria um tipo de papo entre A e B. 

A outra questão, relativa à web rádio ser pouco levada a sério como veículo, tem que ver com a internet ainda ter menos prestígio como um lugar de trabalho. Isso talvez não seja uma questão específica aqui do sul. No caso do rádio, acredito que isso influencie no fato de muitas emissoras online do Brasil ainda imitarem as rádios FM. Na contramão disso, a proposta da Rockpedia é justamente atuar na lacuna histórica que esse modelo deixou, porém sem perder nada da qualidade técnica sonora que já sabemos que existe. Para nós, essa qualidade é um dos pilares da Rockpedia, tanto que um de nossos slogans é “Rockpedia, a casa do som”. Há, também, uma disparidade técnica entre as rádios online, por enquanto, que contribui para que o setor ainda tenha uma característica muito amadora, afastada daquilo que se possa considerar “trabalho sério” nos padrões da mentalidade da mídia tradicional. Quero lembrar, além disso, que a Rockpedia funciona com uma equipe pequena composta fundamentalmente de amigos e parceiros, ao contrário de uma megaempresa de mídia, apesar de já existir até quem me chame de CEO [risos]. 

Por fim, um grande desafio é a busca por investidores que acreditem nesse novo modelo. Um projeto de rádio na internet, a exemplo da Rockpedia, requer um anunciante sintonizado com a proposta. Quem será esse anunciante? Primeiramente, será um cara comprometido com a comunidade onde está inserido. Depois, o anunciante da Rockpedia é inteligente e valoriza o significado do produto, que vai além da venda pura, da badalação do momento e do imediato. Ele tem que saber que está investindo em conteúdo, em algo significativo para ele mesmo e para seus clientes, e não apenas em uma vitrine estática sem identidade. Então, o anunciante da Rockpedia tem que se identificar com a proposta e com o conteúdo derivado de pesquisa musical, cultural e artística da nossa rádio. Ainda por cima, ele não será, certamente, um cara inocente que acredita na grande falácia da mídia tradicional quanto à formação do gosto do brasileiro. Aqui na Rockpedia, oferecemos um tipo de pesquisa que não dispensa o debate nem o contato com o público, ampliado, registrado e transparente, pela própria fase tecnológica em que estamos vivendo. É só observar as redes sociais.

HEAVYNROLL - Alguma história marcante neste primeiro ano?

LUCIANO - São tantas! Tenho tido muitas boas surpresas. Já de saída, te digo que três delas acabaram se tornando verdadeiras cicatrizes na identidade da própria rádio: o carinho da audiência, a adesão dos artistas e as conversas com o pessoal estrangeiro. A amplitude do contato dos artistas comigo gerou a primeira grande marca na nossa história de primeiro ano. 

Em primeiro lugar, um choque. Receber material cultural da banda THE MUGS, de Detroit, por exemplo, foi o começo de uma avalanche. Depois vieram as bandas SIN CITY da cidade de Zweibrücken, a PSYCODTHRONE de Barcelona, a VONATION de Bern, que é uma banda mista de brasileiros com músicos de outras nacionalidades. Entre elas, independentemente da ordem de aparição, também vieram bandas das cidades de Estocolmo, da Cidade do México, de Buenos Aires de onde vieram três bandas, de Lisboa e, acima de tudo, das mais variadas e distantes localidades do Brasil: São Luís do Maranhão, Goiânia, Vitória, Ouro Preto, Brasília, Campinas, São José dos Campos, São Paulo, sem falar em vários municípios da Baixada Fluminense que me causam uma sensação de proximidade incrível. Continuando, a onda foi descendo aqui para o sul, para as cidades de Londrina, Chapecó, Porto Alegre, Caxias do Sul, Bento Gonçalves em especial onde a Rockpedia tem contato com muitas bandas excelentes e também com uma grande audiência. Então, essa foi uma verdadeira surpresa que me causa ainda grande alegria e naquele momento causou, ao mesmo tempo, um friozinho na barriga, porque eu senti o quanto era significativo e necessário, para outras pessoas, aquilo que eu estava fazendo. 

Depois, veio uma das histórias mais marcantes da Rockpedia: o momento da aproximação de ídolos da minha juventude, caras que estão produzindo a mil. O primeiro a chegar, aliás, um cara que é primeiro em muitos aspectos da nossa música, foi o Bebeto Alves. Ele me concedeu uma vídeo-entrevista super-carinhosa, emprestando naquele vídeo boa parte da sua credibilidade artística ao projeto Rockpedia e, para mim, isso foi simplesmente fantástico. A partir daí, percebi que grandes artistas que eu admirava como fã tinham projetos em andamento e continuavam sendo os melhores exemplos de compositores da nossa música. Eles precisavam de divulgação, porque, como sempre, eles têm muito a dizer. Escolhi divulgá-los. Como resultado disso, gravei entrevistas com todos eles e elas agora compõem parte do conteúdo mais valioso da rádio, por ser um documento histórico. 

A terceira história que me surpreendeu foi o comportamento de ouvintes muito participativos. Com isso, fiz contato com pessoas que são ouvintes e artistas muito talentosos, divulgadores de sua própria produção, que precisavam de espaço na mídia, e que compartilham informações sobre produções de outros artistas. Formou-se uma verdadeira teia de artistas com os quais eu jamais entraria em contato, não fosse pela comunicação permitida pela tecnologia da internet e pelos próprios ouvintes. Se eu pudesse citá-los todos, a entrevista teria dez páginas [risos]. Mas, quero deixar claro que a audiência da Rockpedia não apenas participa como também toma posse da ação, da palavra, da informação e da criação de um conteúdo que, por isso, acaba sendo especialmente significativo para todos os que foram se achegando. São essas atitudes de compartilhamento que me dão certeza de estar no rumo certo.

HEAVYNROLL - Quem são "os caras" que fazem a Rockpedia?

LUCIANO - Hoje são vários caras. Mas como eu comecei sozinho, acabei acumulando algumas funções, até porque na minha vida profissional eu sempre fui mesmo o tipo faz-tudo. Vale lembrar que minha dedicação exclusiva à Rockpedia só foi possível por que eu fiquei desempregado durante um bom tempo e ela foi a chance de extravasar minha paixão pelo rádio, mesmo sem ganhar um tostão. Então, parte da Rockpedia sou eu, Luciano Cardoso, que sou responsável pela criação da plástica da emissora e ocupo os cargos de diretor executivo, além de cozinheiro, operador de áudio, coordenador de programação, administrador, apresentador, entrevistador e até publicitário. Aos poucos fui recebendo pessoas, mesmo sem vínculo empregatício e sem grana envolvida, (afinal quem vai pedir emprego para um desempregado?) que, na verdade, são meus amigos, e que têm muito talento para mostrar. Eles viram uma oportunidade de canalizar sua enorme e transbordante criatividade para o projeto. 

O primeiro cara a aderir à brincadeira foi Moisés Peteffi. Ele é o cara que empresta toda a sua irreverência para as vinhetas, chamadas e áudios da rádio rock. O Moi empresta toda a curtição que ele tira do mar, do sol e das ondas da praia onde mora em Santa Catarina e, para mim, ele acabou se transformando na voz da Rockpedia. Outro cara que traz mar e música pra programação é o Léo Vargas. O Léo é meu amigo e assessor para assuntos de animais domésticos, principalmente cães e gatos. Ele é também publicitário de formação, surfista que, na rádio, produz e apresenta o programa BeSurf, trazendo notícias dos campeonatos e uma seleção de músicas que levam a nossa imaginação para a beira da praia. Dee Jay Zonattão, de Bento Gonçalves, apresenta o Black Beat. Ele é um pesquisador incansável da Black Music de todos os cantos do mundo. Stevow Ger mora na Suíça, mas é um brasileiro esqueitista, recentemente todo esfolado por um tombo, também é produtor musical da banda VONATION e nosso apresentador do Alternative Power. É dele a voz radical que você ouve aos sábados. Além deles, há a professora Demirse Ruffato, da área de Letras, responsável por um projeto satélite, a Revista Rockpedia. Ela também assessora a apresentação dos textos da emissora, como o texto de apresentação da rádio. Ali nós damos espaço para a publicação de textos, crônicas, poemas, resenhas sobre Comic Novels, games, músicas, gastronomia.

Sem esses pontos de contato com outros projetos da nossa região e fora dela não seria possível fazer rádio como queremos e acreditamos, isto é, em constante clima de descoberta e pesquisa. Temos muitos colaboradores de conteúdo que também são caras que fazem a Rockpedia, mesmo sem serem funcionários do tipo convencional (o que obviamente não temos). Um exemplo disso é o professor de história Renato Aranha. Ele é o cara que eu considero o embaixador da Rockpedia lá na Baixada Fluminense, vocalista e compositor da banda Rota Espiral, ele sempre descobre um artista que precisa de divulgação e o direciona para mim. Além disso, lá de fora, temos Mr. Bob Wilsom e Julia Maidment, apresentadores do programa Rock on the Ridge, na Ridge Radio que fica na cidade de Caterham, na Inglaterra. Bob e Julia são nossos ouvintes, amigos da Rockpedia e parceiros de conteúdo, pois trocamos muitas figurinhas locais via internet. Então não se surpreenda se o teu som tocar lá na Ridge Radio.

Além disso, muita gente colabora divulgando e alimentando debates sobre rádio e comunicação social. De São Leopoldo, o músico Bebeto Alves está constantemente interagindo com as discussões e propondo assuntos, muitas vezes de maneira educativa da nossa consciência sobre arte e comunicação. Aqui, bem perto, uma atividade muito importante vem do meu amigo e professor de história Samuel Oliva. Ele é o cara do projeto satélite Rockpedia na Escola. Juntos, fizemos o primeiro contato com as escolas da rede pública, numa ação simples, mas intensa, que foi a palestra na escola José Generosi, em Forqueta. Há excelentes divulgadores que se alinham com a ideia da rádio e o próprio Marco Paim, com seu blog HeavynRoll é um deles. O Chico Casara, corretor de imóveis, meu amigão, músico e nosso mais empenhado divulgador e estrategista está sempre na audiência e na panfletagem da rádio. Em Porto Alegre está o Gilnei Lima, com o seu site de notícias gilneilima.com em que faz a divulgação da rádio lá na capital. São colaborações especiais. Obrigado a todos, pois sem vocês nada disso teria sido possível. Por causa de vocês a Rockpedia é uma rádio feita de pessoas.

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Para curtir a rádio ROCKPEDIA acesse:
http://rockpedia.com.br


Comentários

  1. É um baita trabalho esse desenvolvido pela Rockpedia!! Nós, os músicos do RS, só temos a agradecer!!

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  2. Muito boa matéria. As ideias e histórias de superação geralmente partem de momentos difíceis de nossas vidas pessoais, com certeza dessa forma a vitória se torna bem mais saborosa. Forte abraço a todos. Obrigado pela menção ao meu nome. Minha pequena contribuição parte do princípio de que boas ideias precisam ser valorizadas. Paz e sucesso sempre. Acredito ainda no dia em que faremos um grande festival e que todos nós, artistas, ouvintes e comunicadores da rockpedia estaremos felizes, regiamente pagos, e com a plenitude de missão cumprida.

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