[Matéria Especial] Existe União Na Cena Rocker de Caxias?

Algumas questões me intrigam ao observar o público nos shows da cidade. Noto que muitos músicos, digamos "conhecidos", não comparecem aos shows de outras bandas. Há o famoso "só vou no show de sua banda se for no show da minha". Mas será que tudo isso é proposital? O que realmente rola nos bastidores do circuito de shows? E sobre os festivais e coletivos? Uma nova forma de alavancar a arte está surgindo, cada vez mais alguns estilos musicais juntam forças entre os seus e movem montanhas. 
Para tentar desvendar este mistério e falar um pouco sobre os movimentos culturais da cidade, Pablo Lucena (Barracuda Project), Marcelo Poletto (Mouai) e Jonas Bender (Slow Bricker) respondem algumas perguntas dando um parecer de suas próprias experiências.

HEAVYNROLL - Você acha que há uma união musical em Caxias do Sul?

Marcelo Poletto
MARCELO - É possível dizer que existe em cada tipo de união um nível diferente de interação. Cada estilo musical tem seu tipo de relacionamento. Há também que separar os que realmente fazem, produzem e colocam a mão na massa para acontecer essa união dos apenas entusiastas que gostariam que isso acontecesse mas ficam de braços cruzados, dos admiradores que apenas observam de fora o que rola no cenário e dos que don't give a damn…

JONAS - Ainda não existe a união ideal, com o fluxo muito grande de informação e de diferentes nichos musicais, inclusive dentro do Rock, as bandas acabam se dividindo por estilos e acabam se formando espécies de "panelinhas". Nós do Slow Bricker por exemplo, nos unimos a duas bandas parceiras da cidade e também a outras bandas de fora, que fazem um som com propostas semelhantes a nossa, pois foi a maneira que achamos de nos ajudar, marcar shows juntos, fazer intercâmbio de cidades e essas coisas. 

PABLO - Pouca, quem tem esconde pra si, bem escondidinho. Em algumas épocas acabam se formando grupos em função de um meio catalizador. Nos últimos tempos tem existido alguma movimentação para unir os músicos, mas sem muitos resultados práticos. No longo prazo eu acredito que pode mudar.

HEAVYNROLL - Noto que nos shows ou festivais que vou o número de integrantes de bandas é bem pequeno, principalmente das mais conhecidas. E geralmente em festivais, depois que sua banda toca, os integrantes vão embora e não ficam para prestigiar as que vem depois. Na opinião de vocês, por que isso acontece?

Jonas Bender
JONAS - Porque não existe a união que deveria existir e também existem certo estrelismos totalmente ilusórios e até mesmo meio cômicos, já que somos todos músicos de uma colônia de 400 mil habitantes, não estamos em Londres ou Nova York. Se pelo menos os integrantes das bandas ficassem nos festivais para se prestigiarem mutuamente já teríamos um bom público garantido.

PABLO - Talvez porque não tenha roadie ou camarim e tenham que levar os equipamentos embora? hehehe. O cara toca em Nova Milano e acha que é o novo Led Zeppelin! Alguns deixam as pequenas coisas subirem a cabeça. Outros é porque tem que ir pra casa cuidar da mulher (marido) e dos filhos. Porque a cena também tem pais de família.

MARCELO A questão de prestigiar os shows e festivais é delicada. Acredito que é importante prestigiar o evento pelo simples fato de fazer número e mostrar que esse tipo de apresentação é válido, pois diversas vezes alguém tem uma iniciativa boa, mas o público não comparece e o projeto não tem continuidade enquanto o público fica apenas reclamando que não acontece mais. Várias vezes fui em shows de bandas que não gostava ou que eram ruins que tocavam o mesmo estilo ou algo parecido para impulsionar o movimento, o estilo e não deixar morrer, pois fica difícil pra todos. Há também que fazer a ressalva que às vezes em detrimento de outros compromissos da banda ou particulares não é possível prestigiar o resto do evento, ou até quando se toca fora da cidade existe um bom trecho de estrada pelo caminho e acaba sendo mais seguro voltar mais cedo. Mas a questão é que tem muitos músicos que só olham para o próprio umbigo e pouco se importam com o que é produzido pelos outros proporcionando esse tipo de cena de abandonar os festivais e afins. Se caso permanecessem e trocassem uma ideia com o resto dos músicos e o público haveria mais do que falávamos, união musical.

HEAVYNROLL - As bandas procuram se ajudar ou há uma certa rivalidade entre músicos e estilos?

JONAS - O ideal seria que as bandas se ajudassem, mas acredito que há sim uma certa rivalidade. Até certas amizades entre músicos tem interesses maiores guardados.

PABLO - Existe rivalidade dentro do mesmo estilo, ainda mais entre diferentes.

HEAVYNROLL - Hoje em Caxias temos o ManiFestaSol, uma movimentação artística que agrega várias bandas e outros segmentos de arte em uma constante ajuda mútua. Isso acontece entre bandas ditas psicodélicas, instrumentais ou experimentais. Um exemplo a ser seguido? Entre outros estilos é viável?

Pablo Lucena
PABLO - Eu acredito que os festivais são uma forma importante pra expandir e desenvolver o meio artístico musical. Mas creio que o que está faltando mesmo é um circuito de bares/casas que aceitem e incentivem a música autoral regional. Isto seria importante pro desenvolvimento das bandas no dia a dia. Um pouco também é culpa do público, culturalmente atrasado e quer mesmo é escutar todo sábado: "Benzinho eu ando pirado..blábláblá"

JONAS - É um belo exemplo a ser seguido, pois poderíamos de alguma forma organizarmos as panelas coletivas por estilo. Teríamos por exemplo um coletivo metal, um punk, um hard rock, um alternativo. Acredito que não haveria a integração ideal, já que ficaríamos muito limitados no quesito público separado por gêneros, mas seria uma forma de todos, de repente, terem oportunidades de se apresentarem também. 

MARCELO - O ManiFestaSol é um projeto muito bacana e verdadeiro ao meu ver. Creio que seja sim um bom exemplo. Vejo algo parecido acontecendo entre bandas de metal que costumam organizar festivais para tocar e curtir. Em outros estilos acaba sendo mais esporádico ou simplesmente não tenho conhecimento. Acredito que falta gente querendo botar a mão na massa e principalmente gente que compre a ideia e prestigie os eventos, pois chega uma hora que quem toma iniciativa cansa de ter sua energia subestimada e não compartilhada. 


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Comentários

  1. Baita matéria! O que o Pablo cita, em relação ao público, pode ser algo bastante notável, volta e meia temos bandas autorais tocando num espaço relativamente vazio, enquanto as bandas-tributo e covers ainda ganham mais resposta do público. Isso é bastante desistimulante... mas não podemos desistir, mesmo que seja um processo complicado que o público entenda a importância de estar apoiando e curtindo a música autoral na cidade. Os bares também deveriam apoiar mais, mas como a resposta do público muitas vezes não é suficiente, ficam com aquela pulga atrás da orelha, e isso é bastante lamentável. Creio que juntos, podemos realmente fomentar uma maior circulação de pessoas e bandas ligadas à cena.

    Posso respeitar todo músico que trabalha com covers ou tributos, mas evito de sair para vê-los, pois isso vai contra toda uma construção conjunta, pela valorização da música autoral e do artista independente que produz arte e cultura no Século XXI.

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